Lá estávamos nós, diante daqueles zumbis horripilantes, nojentos, saindo debaixo da terra e comendo pedaços de pessoas. Desde a minha adolescência que não assistia mais a esses filmes e a minha tendência ainda é virar o rosto ou tampa-lo com a almofada quando a cena fica, ao meu ver, “forte” demais.
Mas hoje eu me entrego a cena até o final, pois com a maturidade percebi que a minha imaginação e as fantasias criadas pela minha mente são capazes de provocar mais sensações desagradáveis do que o filme em si.
Assim é composta a beleza do nosso sistema interior, os sentimentos primários acionam nossa mente e avisam que algo está nos ameaçando e naturalmente nosso corpo vai reagir a esse estímulo. A música angustiante que começa a tensionar nossa musculatura diante de um filme de terror, o susto inesperado provocando nossos gritos, a imagem de algo desfigurado que pode estimular emoções como medo ou nojo…
Medo, tristeza, alegria e raiva são sentimentos primários prontos para nos defender nas rotinas diárias e sinalizar que algo está nos tirando do equilíbrio, da nossa homeostase.
Uma depressão por exemplo pode esconder sentimentos de raiva, que se vierem à tona podem comprometer esse equilíbrio, então a mente sabiamente se defende, nos protege.
Sim, todo adoecimento é uma tentativa de cura, e onde estão os sinais?
Dentro do caldeirão, nosso caldeirão interno.
É nele que podemos mergulhar para decifrar os sinais; Descobrir do que essas emoções estão nos protegendo.
Sabe aquele momento que a Bruxa está ali, diante de seu caldeirão? Me encanto, pois ela começa a usar todas as coisas incomuns e nojentas e que nos provocam asco: pé de rã, asa de morcego, dedo de criança, lagartixas…
Mas porque não gostamos de olhar dentro do caldeirão?
Porque quando estamos imersos nessas emoções primárias, segundos após, os sentimentos racionalizados assumem o controle e partimos para o julgamento.
Como você deve ter feito quando começou a ler os ingredientes insólitos da bruxa.
É aí que começa toda confusão…
Medo é Medo, e só.
Asa de morcego é apenas uma asa de morcego; mas se você se imagina comendo-o…
Aparecem os julgamentos!
Construímos sentimentos influenciados pelo nosso meio cultural sobre emoções tão naturais, como por exemplo: Quem sente medo é fraco, covarde, sem coragem…
Olhar o desagradável não é algo confortável mas olhar e mergulhar dentro desse caldeirão pode oferecer alívio.
Me encanta quando a bruxa prepara seu antídoto, pois pode utiliza-lo para curar e transformar. Tudo vai depender do “como” ela decide usar a sua matéria prima.
Ter a sensibilidade de ver o que está atrás da porta, como citei no post anterior, talvez seja mais libertador do que conviver o resto da Vida angustiado com “o que pode haver atrás da porta”, aterrorizado pelo fantasma daquilo que não se quer ver.
E embora exista antídotos comercializados que ajudem no controle da palpitação, da falta de ar, da tensão, para controle do mal-estar provocados pelas emoções primárias; como toda poção, se não for usado com sabedoria, pode mantê-lo preso com esses fantasmas indesejados pelo resto da Vida.
Paralisado…
Outro dia meu filho foi para aula fantasiado de zumbi, e achei que voltaria querendo se fantasiar com os modelos que viu dos amiguinhos, vampiros perfeitamente caracterizados, lindos e fofos.
Pois como a professora disse que ele estava “aterrorizante”, achei que iria interpretar isso de forma negativa.
Foi então que ele me surpreendeu;
- Mamãe, da próxima vez que pintar um zumbi você pode colocar um cérebro caindo aqui?
Caí na gargalhada e respondi que sim.
Se não fosse nosso avesso não haveria suporte para nossa construção externa.
Quando se procura evitar ou negar aquilo que se está sentindo, acaba-se por sentir-se mais mal ainda.
Mas se até as crianças se divertem e acham o caminho para lidar com essas emoções, imaginem nós que já ensaiamos e vivenciamos tantas emoções no decorrer da nossa Vida.
Aproveitando o clima de Halloween, vamos mergulhar nesse caldeirão?
1 comentário em “Medos: Vamos olhar o que há no caldeirão?”
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